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"Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o Universo e os deuses."
Sócrates

Em essência somos Um, interconectados com o Universo. A diversidade e o respeito a toda forma de vida é o que move meu propósito.

"A Verdade é uma terra sem caminhos" J. Krishnamurti

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Ayahuasca




O debate atual que vem ocorrendo em torno de alguns tipos de substâncias usadas pelo ser humano para rituais sagrados e em busca de seu autoconhecimento, nos impulsiona a discutir sobre essa questão de forma clara e objetiva, sem preconceitos ou dogmas velhos e ultrapassados da sociedade antiga, que hoje ruma a um desenvolvimento mais pleno e abrangente de sua real capacidade como seres espirituais.

Nesse blog, você encontrará discussões úteis, práticas e que lhe permitam desenvolver com liberdade de expressão, sua forma de ser, pensar e agir. 

Hoje, elucidaremos um pouco o tema sobre a Ayahuasca, ou o Santo Daime, manifestação religiosa encontrada no Brasil, fundada pelo Mestre Raimundo Irineu Serra, no Acre no início do século XX.

A Ayahuasca, ou Santo Daime é uma bebida conhecida milenarmente pelos povos das américas e foi, durante todo este período, utilizado de forma sagrada e ritualística por estes povos, porque tem um grande poder alterador da consciência humana.

Este poder de alterar a consciência permite que o indivíduo que utiliza esta bebida entre num estado de percepção bastante profunda sobre si mesmo. É uma característica do Santo Daime propiciar uma viagem para dentro de si mesmo, levando aquele que o utiliza, a níveis muito profundos de auto-consciência e de auto-entendimento. Assim, esta bebida foi e é conhecida pelos povos nativos do nosso continente como uma substância enteógena, que significa aquela que tem Deus dentro (do grego theos, genus). É exatamente por esta razão que sempre foi utilizada de forma sagrada e ritualística e não poderia ser de outra maneira. É um veículo muito poderoso que permite um indivíduo se encontrar consigo mesmo de forma bastante profunda.

O Santo Daime é uma bebida obtida através do cozimento em água de duas plantas nativas da região amazônica: um cipó, de nome científico Banisteriopsis Caapi, conhecido também como Jagube ou Mariri, e um arbusto da família do café, de nome Psychotria Viridis, conhecido popularmente como Rainha ou Chacrona. Estas duas plantas contêm, cada uma, substâncias bioquímicas que, juntas, são complementares porque se encaixam perfeitamente no funcionamento do sistema nervoso humano de uma forma que é tranqüilamente absorvida pelo organismo, sem causar qualquer tipo de agressão ou de dependência. A junção destas duas plantas também traz o perfeito equilíbrio energético do feminino e do masculino, do yin e do yang, da Lua e do Sol. A Rainha possui uma força evidentemente feminina e é nela onde reside o poder de visão da bebida, contida numa substância abundante de sua seiva, conhecida como DMT (dimetiltriptamina), enquanto que no Jagube está a força masculina deste equilíbrio contida nos alcalóides Harmala (Harmina, Harmalina, Tetrahidroharmina, Harmalol e Harmol, estes dois últimos em menores concentrações).

Para que possamos entender o funcionamento destas substâncias no corpo humano, é necessário um conhecimento prévio resumido do funcionamento da área mais nobre do cérebro humano, que desempenha funções de planejamento de atividades no tempo e é também responsável pelo foco de atenção que nos permite a concentração necessária para realizar qualquer tarefa. Esta região cerebral é movida por um neurotransmissor, que é a molécula que se encaixa entre um neurônio e outro com a finalidade de conduzir estímulos nervosos através da teia neuronal, chamado Serotonina. Este neurotransmissor é produzido no interior do cérebro humano e também no trato gastrointestinal. Em um indivíduo normal, sua produção é obtida através do L-Triptofano, um aminoácido alimentar essencial. Quando um indivíduo entra num processo depressivo, há deficiência na produção de Serotonina, que pode ser causada pela falta das substâncias primordiais para a sua produção ou por alguma deficiência do sistema produtor deste neurotransmissor, sendo que um dos primeiros sintomas da depressão é justamente uma dificuldade que o indivíduo passa a ter quanto a focar sua atenção em qualquer tarefa que for realizar. A Serotonina é uma substância que tem uma vida útil no corpo humano e, uma vez expirado este prazo, ela é metabolizada por uma enzima também produzida na região gastro intestinal, conhecida como Monoaminoxidase ou MAO. Esta enzima, quando em ação, regula os níveis de Serotonina no interior do cérebro humano num indivíduo normal. Ela é liberada no sangue através de mensagens que chegam do cérebro ao estômago através do nervo pneumogástrico. Existe também um outro mecanismo neurológico que é responsável pela diminuição dos níveis de Serotonina, que está localizado no interior do cérebro e é conhecido como Sistema de Recaptação de Serotonina. Este sistema recapta as moléculas de Serotonina que vagam pelo cérebro e as reencaminha a neurônios que necessitam de neurotransmissores para cumprir sua função. Assim, todo este mecanismo garante o funcionamento do sistema nervoso humano, de acordo com o projeto original.

Quando uma pessoa se encontra num estado depressivo e passa por um tratamento psiquiátrico, ela pode receber a prescrição de algum remédio anti-depressivo, que é um recurso químico muito utilizado pela medicina convencional nos dias de hoje. Existem algumas drogas destinadas ao tratamento de depressão que foram desenvolvidas para inibir completamente o Sistema de Recaptação de Serotonina por um tempo bastante prolongado, e são potencialmente perigosas de serem utilizadas concomitantemente ao Santo Daime, podendo gerar uma crise serotoninergética no indivíduo, como veremos mais adiante. As drogas mais conhecidas que possuem esta característica de inibir o Sistema de Recaptação de Serotonina são:

Biozac
- Clorixetin
- Daforin
- Deprax
- Depress
- Eufor
- Fluoxetin
- Fluoxil
- Fluoxon
- Fluozet
- Fluxene
- Fluxtina
- Nortec
- Prozac
- Psiquial
- Sostac
- Verotina ou qualquer outra droga que contenha Fluoxetina.


No entanto, a química destas drogas foi posteriormente redesenvolvida e gerou outros remédios psiquiátricos mais modernos (por exemplo, a Sertralina e a Paroxetina), que realizam a inibição da MAO e não interferem mais no Sistema de Recaptação de Serotonina. Estes remédios psiquiátricos mais modernos podem ser utilizados juntamente com o Santo Daime, sem oferecer nenhum risco ao paciente. De qualquer maneira, é fortemente recomendado que a pessoa que utiliza qualquer droga psiquiátrica passe por uma avaliação médica antes de utilizar o Santo Daime.

A função das drogas psiquiátricas é a de aumentar artificialmente os níveis de Serotonina no cérebro, impedindo que os sintomas da depressão apareçam. No caso do paciente depressivo suspender o uso da droga, os sintomas da depressão voltam a aparecer se o seu corpo ainda possuir a mesma deficiência na produção de Serotonina que o levou ao tratamento médico.

O Santo Daime, como já foi dito, possui duas classes de substâncias que geram os seus efeitos psicoativos: a DMT, contida nas folhas da Rainha, e os alcalóides Harmala, contidos no cipó Jagube, em maior concentração na sua casca.

Dentro da alquimia da natureza, de forma exatamente igual, a DMT também é produzida pelo corpo humano, em quantidades bem pequenas, e alguns estudos científicos ainda não totalmente comprovados apontam no sentido de estar ligada às visões coloridas que temos nos sonhos quando dormimos. Algumas pessoas desenvolvidas mediunicamente também já foram estudadas na sua bioquímica por cientistas, onde houve constatações de que há, nestas pessoas, uma quantidade maior de DMT do que em indivíduos que não passaram pelo processo de desenvolvimento destas faculdades espirituais. Portanto, bioquimicamente falando, a DMT também é a chave que liga o ser humano ao mundo espiritual. Ela é a molécula que pode dar aos homens a visão do mundo espiritual. Por outro lado, quimicamente, a molécula da DMT é virtualmente idêntica à molécula da Serotonina, com algumas pequenas diferenças. Isto significa que ela se encaixa perfeitamente nos mesmos neurônios que utilizam a Serotonina como meio de transmitir estímulos nervosos a outros neurônios. Assim, um indivíduo sob o efeito de um aumento considerável na quantidade de DMT no cérebro, terá uma abertura da sua visão espiritual, ou do que os orientais chamavam de terceiro olho. Em outras palavras, a DMT é uma janela para o mundo espiritual. E como esta molécula ativa neurônios no cérebro, em grandes quantidades ela se espalha por regiões cerebrais que fazem parte da parcela inconsciente humana, ou seja, permite ao indivíduo que, sob o seu efeito, faça uma “viagem” ao seu inconsciente, que amplie o conhecimento de si mesmo, que traga este conhecimento para o lado consciente, despertando faculdades que, muitas vezes, nem sabia que possuía.

Mas existe uma pré-condição para que a DMT possa penetrar na corrente sangüínea por via oral, o que não acontece num chá que contenha somente DMT, porque no próprio estômago é produzida a enzima MAO que metaboliza a Serotonina e também sua molécula gêmea. Para que a DMT não seja metabolizada diretamente no estômago e consiga penetrar na corrente sangüínea, há necessidade de que a produção de MAO seja suspensa temporariamente, efeito este que é obtido pela presença no chá dos alcalóides Harmala, contidos no cipó Jagube. Em outras palavras, é o cipó que abre o caminho para que a DMT da folha entre na corrente sangüínea pela via oral. Também os alcalóides Harmala têm um efeito psicoativo devido à inibição, desta vez parcial, do funcionamento do Sistema de Recaptação de Serotonina contido no interior do cérebro humano. Isso resulta num aumento dos níveis de Serotonina no cérebro de um indivíduo quando este está sob o efeito do Santo Daime. Este resultado é perfeitamente perceptível através do aumento da capacidade de concentração e de atenção que o indivíduo sente quando está sob o efeito da bebida. Este efeito de melhora na concentração e na capacidade cognitiva de uma pessoa perdura e se consolida de forma crescente conforme exista uma continuidade e uma constância no consumo do Santo Daime na sua vida. Há também uma imunidade adquirida, por indivíduos que consomem o Santo Daime durante muitos anos, a doenças degenerativas do sistema nervoso central. Este é um fato que já foi comprovado por uma comissão de cientistas que estudou membros na União do Vegetal durante a década de 1980.

Há ainda alguns efeitos secundários que o Santo Daime pode provocar num indivíduo, devido às substâncias que contém. O primeiro é o efeito purgante provocado pelo cipó, que muito foi explorado pelos povos nativos na sua história para limpeza orgânica e curas pela desintoxicação. Este efeito não acontece sempre e nem em todos os indivíduos que utilizam o Santo Daime. Do ponto de vista bioquímico, o segundo é o efeito do vômito, que pode ser provocado pelo excesso de mensagens enviadas do cérebro ao estômago, através do nervo pneumogástrico, para que haja produção de MAO para baixar os níveis de Serotonina em alta no sistema nervoso central. Como o sistema produtor de MAO é inibido temporariamente pelos alcalóides Harmala do cipó Jagube, estas mensagens não surtem efeito e o seu excesso e constância podem provocar náuseas. Como os alcalóides Harmala também inibem parcialmente o Sistema de Recaptação de Serotonina no interior do cérebro, este sistema volta a funcionar sozinho conforme os níveis de Serotonina aumentam, sem depender da produção da MAO, regulando assim a bioquímica do cérebro sem risco de se chegar a um estado tóxico que uma síndrome serotoninergética traria. Uma síndrome de excesso de Serotonina no cérebro pode acontecer apenas se houver inibição total da produção de MAO concomitantemente a uma inibição também total do Sistema de Recaptação de Setoronina. Isso pode acontecer se o indivíduo estiver utilizando uma droga psiquiátrica que iniba totalmente o funcionamento do Sistema de Recaptação de Setoronina e, ao mesmo tempo, ingerir o Santo Daime, que inibe completamente o sistema produtor de MAO. Neste caso, o cérebro perderia temporariamente todos os mecanismos de controle dos níveis de Serotonina, podendo conduzir o sistema neurológico a um estado tóxico com perigo de morte. É exatamente por isso que há necessidade de uma atenção especial e acompanhamento médico a todos os indivíduos sob tratamento psiquiátrico que pretendem tomar o Santo Daime. É necessário que se verifique antecipadamente o tipo do anti-depressivo que está sendo utilizado e, no caso de ser uma droga que ofereça este tipo de risco, deve ser suspensa a sua utilização ou ser substituída por outra compatível a se utilizar concomitantemente ao Santo Daime. Sob orientação médica, o Santo Daime, por si só, pode servir como um anti-depressivo natural, pois chega aos mesmos resultados bioquímicos de algumas drogas utilizadas pela psiquiatria tradicional para tratamento de pessoas depressivas, sem nenhum tipo de efeito colateral.

Do ponto de vista espiritual, é muito claro que, tanto o efeito purgativo quanto o vômito, são efeitos diretamente ligados a uma limpeza energética que a bebida realiza no indivíduo. O Santo Daime possui a capacidade espiritual de expulsar toda e qualquer energia de desarmonia e perturbação de uma pessoa através do vômito ou da diarréia, que normalmente são seguidos de uma sensação de alívio e conforto muito grandes após qualquer dos processos de limpeza. Também conforme a continuidade e a constância do consumo do Santo Daime, normalmente é observado que os processos de limpeza, numa pessoa, diminuem de intensidade e de freqüência com o passar do tempo.
A absorção de todas as substâncias contidas no Santo Daime pelo organismo humano é feita de forma absolutamente natural, sem trazer prejuízos à saúde e nem apresentar qualquer efeito de dependência à bebida. Isto também foi objeto da pesquisa científica que apoiou o parecer favorável à liberação oficial na forma da lei do uso religioso do Santo Daime no Brasil, dado pelo antigo Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN) e consolidado pelo atual Conselho Nacional Anti-Drogas (CONAD). Este parecer favorável foi dado pelas autoridades brasileiras após ser formada uma comissão multi-disciplinar composta de cientistas, médicos, psicólogos, psiquiatras, antropólogos, biólogos, historiadores, sociólogos, membros da polícia federal e do exército, que analisou o Santo Daime em todo o seu contexto, desde seu conteúdo químico, suas implicações psiquiátricas até o ambiente social que o envolve. Este estudo foi feito durante alguns anos na década de 1980 e gerou um relatório final que suspendeu o DMT do DIMED, uma lista de substâncias proibidas, publicada inicialmente sob orientação da ONU. Com esta suspensão, o Santo Daime passou a ser reconhecido pela lei brasileira como uma legítima manifestação dos costumes dos povos nativos do Brasil, onde há mais de 70 tribos indígenas que fazem uso em suas tradições, respeitando assim uma herança cultural que perdura há mais de 4 mil anos.

Caio Bastos
Céu da Lua Cheia
24/08/2005